quarta-feira, julho 11

A História da Infância e dos Contos - parte 2


A História da Infância e dos Contos
Segunda Parte

Com os contos, já viajamos por tempos primitivos, entre civilizações do oriente médio e pelas cidadelas medievais, observando a relação entre a infância e as narrativas de tradição oral. Seguindo o curso da história, passaremos ao espaço de tempo entre os anos de 500 a 1a.C., época em que a civilização greco-romana existiu.

Inicialmente, a criança grega era educada por seus familiares no ambiente doméstico. Depois disso, pedagogos eram nomeados para conduzir sua educação, orientando-a de acordo com a classe social. Em geral, elas aprendiam determinados hábitos e ofícios, a iniciação musical era estimulada e a oratória era imprescindível para a classe dominante visto que já naquela época, o discurso era usado com o objetivo de manipulação das camadas populares.

Na Grécia Antiga, a educação mudava de acordo com o sexo da criança: as meninas aprendiam a fazer trabalhos domésticos, participavam de alguns rituais e permaneciam na casa dos pais até o casamento, quando passavam a viver tal qual as “Mulheres de Atenas”, da música de Chico Buarque. 

 

Na sociedade que criou as olimpíadas, os esportes eram ensinados aos meninos tanto com finalidades estéticas e quanto como preparação para guerras. Aos três anos eles bebiam vinho para celebrar o final da infância e aos sete iniciava o treinamento nas casernas. Os meninos de linhagens nobres eram enviados aos grandes pensadores e filósofos para aprender matemática, oratória, lógica, artes e, principalmente a conhecer a si mesmo e desenvolver habilidades para liderar o povo.

No que se refere às narrativas, a Grécia Antiga é notória por dois estilos distintos: a Mitologia Grega e as Fábulas. A Mitologia Grega tenta entender e explicar a criação do mundo e de tudo que nele existe. Politeísta, ela atribui a cada um de seus deuses a responsabilidade por um aspecto da vida. Com suas formas e sentimentos humanos, os deuses gregos governavam o mundo do alto do Monte Olimpo. De lá, Zeus, Atena, Apolo, Afrodite e outros usavam as forças da natureza para promover intrigas e aterrorizar a humanidade.


As fábulas por sua vez, são histórias curtas onde os animais ostentam características humanas. De acordo com Nelly Novaes Coelho (1997), as fábulas são contos tidos como admonitórios, que narram situações vividas por animais, seres inanimados e trans-reais, com o objetivo de transmitir preceitos da moralidade. Seus personagens representam as relações entre os indivíduos e suas atitudes em situações da vida real.

Esopo é uma figura lendária. Segundo consta, foi um escravo contador de histórias, possivelmente corcunda e disfluente (gago), que ficou conhecido pela autoria de fábulas muito populares até os dias atuais. Entre suas fábulas mais famosas, estão A Cigarra e as Formigas, A Lebre e a Tartaruga, O Leão e o Ratinho e A Raposa e as Uvas. Para conhecer sua obra, leia As Fábulas de Esopo (2011).


Com a decadência do poder dos gregos, o Império Romano tornou-se muito forte, conquistou muitas terras e dominou a Europa. A força romana se estendeu por quase todo o continente e alcançou outras regiões em torno do Mar Mediterrâneo, devastando sociedades e impondo-se como única possibilidade cultural, conforme comentado em nosso primeiro “encontro”.

Segundo os autores consultados, não havia no vocabulário romano uma palavra específica para designar a família, visto que esta podia ser nuclear (pai, mãe e filhos), ampliada (acrescida de familiares de outras gerações como tios e avós) ou múltipla (quando um contrato reunia sob o mesmo teto diferentes famílias).

Como os divórcios frequentes, as crianças eram entregues sob a responsabilidade do pai que muitas vezes delegava sua educação a amas e escravos. Como eram comuns relações de concubinato, as crianças nascidas dessas uniões eram consideradas bastardas e embora vivessem na casa do pai, não tinham direito à ascensão social.


Em relação aos contos, a Mitologia Romana era similar à grega. De maneira geral, diferem apenas no nome dos Deuses e na maneira de conduzir os rituais, ambos politeístas. Conforme o império avançava e as derrotas aconteciam, diminuía a crença dos romanos em que seus Deuses lhes assegurariam vitórias eternas. Para entender as narrativas dessa época, uma boa leitura é Histórias Greco-Romanas, de Ana Maria Machado (2011).

Com o Império Romano, o Cristianismo se expandiu e passou a dominar a Europa. Veio a era das Cruzadas e de outros tipos de perseguição que fizeram da Idade Média o tempo do obscurantismo. Privado de educação formal, o povo empobreceu e se refugiou na cultura popular.

Desta maneira, as narrativas se tornaram muito comuns e inverteram o caminho, indo das cozinhas e salas de fiar para os salões dos palácios. Sem acesso à escrita e oprimidos pelo poder da igreja, que perseguia, julgava e condenava todas as manifestação que não compreendia ou não concordava, a oralidade possibilitou a transmissão de conhecimentos e tradições, tornando-se uma preciosa forma de preservação da memória coletiva e de lazer.

Naquele tempo, tanto as crianças nobres quanto as plebeias, eram tratadas como se fossem miniaturas de adultos. Não havia nenhuma atenção ou cuidado especial e com frequência os bebês eram separados de seus pais para não atrapalhar suas atividades sociais e recreativas. Possivelmente devido a esse descaso, ao atraso da medicina e às precárias condições de higiene, a mortalidade infantil era altíssima.



Foram essas condições extremas que impulsionaram as tradições de narrativas orais e em especial os Contos de Fadas. Nem as tentativas de moralização e adequação das narrativas à moral cristã diminuiu seu valor como elemento catártico e como produção cultural. Ao contrário, trabalhos como os realizados pelos irmãos Jacob e Wilhelm Grimm ajudaram a difundir a cultura daquela época entre crianças de todas as idades e de todos os tempos. A publicação ‘Histórias das Crianças e do Lar’ é considerada o primeiro livro direcionado ao público infantil e foi através dela os contos populares tornaram-se menos divergentes dos princípios pregados pelo cristianismo e passaram a ser vistos como literatura infantil.

De acordo com Phillipe Ariès, o francês autor de História Social da Infância e da Família, no final do século XIV a infância passou a ser diferenciada da idade adulta e a receber cuidados específicos. Só a partir daí, a educação infantil tornou-se mais valorizada e estimulada, fazendo com que o costume de contar histórias passasse a ser uma prática de estimulação ao desenvolvimento da criança.

Em tempos mais recentes, a infância vem ocupando um espaço cada vez maior na sociedade. Na área da saúde, foram desenvolvidas vacinas, medicamentos e procedimentos para prevenir doenças e preservar a vida das crianças. A educação tem se baseado em estudos científicos e busca orientar o desenvolvimento máximo das habilidades naturais das crianças e a construção de novas competências.  Até a indústria tem se ocupado cada vez mais com a criação de brinquedos e produtos diversos, voltados para este público.

 
Fontes:   http://www.google.com

Atualmente a infância tem até uma data comemorativa. Segundo informações colhidas, no dia 12 de outubro passou-se a comemorar o Dia da Criança no Brasil, a partir de um decreto assinado pelo presidente Arthur Bernardes em novembro de 1924. Por outro lado, a Declaração Universal dos Direitos das Crianças só foi aprovada pela UNICEF em novembro de 1959. De certa forma, essas iniciativas refletem a valorização da infância na contemporaneidade e contribuem para que os contos ganhem novas atualizações e permaneçam como importante recurso mediador do desenvolvimento infantil.

Assim, as histórias que antes eram contadas pelos familiares mais velhos, hoje são oferecidas também em livros, filmes, apresentações de teatro, programas de TV e jogos virtuais. Os personagens tradicionais saíram do imaginário, tomaram forma e estão estampados em uma infinidade de produtos. A cada momento surgem novas edições dos antigos contos e histórias que invertem posições clássicas dos personagens e exercitam a criatividade e a criticidade. Isso aquece a economia, movimentando a produção e o consumo de produtos em forma de filmes, brinquedos, roupas e até parques de diversões. 



 

E o mais incrível é pensar que tudo isso acontece porque, como diz Joana Cavalcanti (2002), “desde sempre o homem narrou” e a força das narrativas permeia as relações socioculturais, renovando-as a cada dia.

Ao redor de fogueiras primitivas, nos desertos do oriente, em vilarejos medievais ou em salas de cinema, com ou sem a figura das fadas, a tradição oral nos lembra de que contar e escutar histórias são habilidades humanas e que em qualquer fase da vida, os contos ensinam que é preciso lutar para vencer as adversidades e conquistar dias mais felizes.

Como isso acontece? Como essas histórias participam do desenvolvimento da das crianças? É sobre isso que vamos conversar na próxima semana! 

Até lá, pessoal!





Cristiane Takemoto 
Fonoaudióloga, Especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional, com formação em Psicanálise Clínica e Mestrado em Linguística. 







REFERÊNCIAS:


ANNAUD, Jean-Jacques. La Guerre du Feu (A Guerra do Fogo). Canadá, 1981.
ARIÈS, Phillipe. História Social da Criança e da família.  Rio de Janeiro: Guanabara, 1978. 

ARRUDA, José Jobson (História Geral) e AQUINO, Rubem (História e Sociedade), disponível em http://www.culturabrasil.org/revolucaoneolitica.htm  acesso em 07/06/12, 10:35hs
CAVALCANTI, Joana.  Caminhos da Literatura Infantil e Juvenil, Editora Paulus, 2004.
COELHO, Nelly N. Literatura infantil – Teoria, análise, didática.  São Paulo: Editora Ática: 1997
ESOPO.   As fábulas de Esopo. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2011.
JACQ, Christian.  Ramsés – O filho da luz.  Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil,  2004.
MACHADO, Ana Maria.   Histórias Greco-Romanas.  São Paulo: Editora FTD: 2011.
REGO, Tereza Cristina. Vygotsky: uma perspectiva Histórico-Cultural da Educação. Rio de Janeiro, Vozes: 1999.           
VYGOTSKY, Lev Semenovitch.  Pensamento e linguagem. São Paulo:  Martins Fontes, 1999.
__________ .  A Formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

2 comentários:

  1. É impressionante o quanto podemos aprender com os contos, o quanto as crianças se revelam em suas narrativas...ansiosa pelo próximo post.
    Parabéns, Cristiane :)

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  2. Obrigada amiga querida!

    Você tem razão!
    Os Contos de Fadas são narrativas muito ricas e nos remetem a uma grande diversidade de conteúdos e informações.

    Bjs,

    *_*


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Elaine Cunha